ALEGRE PÁSCOA FLORIDA E DOCE - IV


A QUEIMA DO JUDAS - IV

A queima do Judas, costume pagão, era praticada em vários lugares do nosso concelho.
Parece que o último reduto foi Águas Boas, onde ainda há poucos anos tal tradição mobilizava muitos adeptos e juntava grande número de curiosos.
Consta que o que pôs termo à brincadeira foi um certo abuso nos ditos que no momento eram proferidos, vindo estes a tornar-se demasiado contundentes, facto que deu origem a graves desavenças.
Este costume, como muitos outros, começou com objectivos moralistas e acabou pelo facto de ter descambado precisamente para o lado oposto.
O ritual era iniciado com um cortejo no qual vinha incorporado o Judas com o saco das moedas, várias carpideiras chorando e muitos populares.
Chegados ao local onde deveria dar-se o enforcamento, geralmente no largo principal, o traidor em sinal de desespero arremessava ao chão com raiva, o saco das moedas e, de seguida, era pendurado por uma corda numa das árvores; porém, antes de ser enforcado, era lido o seu testamento, sendo este o ponto alto de toda esta encenação.
Com o arraial pejado de gente procedia-se à leitura de um rol de críticas de toda a ordem: políticas, sociais, religiosas, desportivas, pecados colectivos e muitas vezes insinuações bem directas, apontando faltas sigilosas e exigir reparo, pondo assim a descoberto a careca de muita gente supostamente considerada de bem; deuses de oiro com pés de barro.
Em tempos já longínquos tudo era dito cara a cara na presença de todos os assistentes, porém as críticas vieram a tornar-se cada vez mais mordazes, facto que levou os seus delatores a esconderem-se e a falarem de dentro de alguma casa vizinha para não serem reconhecidos, procurando no entanto imitar a voz da pessoa a quem era dirigido o mote, tentando que desta forma a assistência ficasse devidamente esclarecida.
Como facilmente o pessoal descobria a quem serviam as carapuças era um fartote de rir!
Concluída a leitura do testamento, culminava a festa com uma sessão de fogo preso já que o corpo do Judas era incendiado e estava sempre bem recheado de bombas de foguete e fogo de artifício.

                                             Aida Viegas



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