Natal de Ontem e de Hoje

 

NATAL DE ONTEM E DE HOJE

 

Noutros tempos, nas nossas aldeias, o Natal era uma festa que se restringia quase exclusivamente a práticas religiosas; festa singela, mas fiel ao seu verdadeiro significado.

Começava-se a preparação com as novenas ao Menino Jesus em todos os lugares, nos nove dias que antecediam a noite de vinte e quatro de dezembro. Homens, mulheres e crianças reuniam-se na igreja ou capela para rezarem e cantarem em louvor do Deus Menino, preparando o seu nascimento e todo o povo ali acorria com grande devoção.

Essa prática caiu no esquecimento, mas há lugares que estão a retomar a tradição.

Ora cantavam os homens, ora as mulheres intercalando fervorosas preces.

Eis algumas quadras dos cânticos, entoados nas novenas, nas noites frias de dezembro.

 


Vinde ó pastores

Com sua alegria

Redentor do mundo

Nasce de Maria (bis) 

 

Do varão nasceu a vara

Da vara nasceu a flor

Da flor nasceu Maria

De Maria o Redentor

 

Vinde ó pastores

Com o seu prazer

Redentor do mundo

Está para nascer (bis)

 

Pastorinhos do deserto

Correi todos a Belém

Adorar o Deus Menino

E a Virgem Sua Mãe.


Na véspera de Natal à tarde, eram os homens quem armava o presépio na igreja onde nunca faltavam: o Menino Jesus, Nossa Senhora, S. José, os Anjos, os Reis Magos, a vaca, o burro e a estrela. Os presépios eram o encanto não só da pequenada, mas dos fiéis que se enterneciam quando na noite ou manhã de Natal encontravam a igreja toda iluminada, com o presépio em lugar de destaque. Raras eram as famílias que em suas casas o faziam.

Nas igrejas era rezada, à meia noite da véspera de Natal, a chamada Missa do Galo e ouviam-se repicar os sinos e estralejar foguetes.

No fim de todas as missas, da quadra natalícia, o padre, acolitado por dois homens de opas e luvas brancas e debaixo de uma umbela dava o Menino a beijar ao som de cânticos de louvor e ninguém arredava pé sem ter beijado Jesus.

Do Natal aos Reis, todas as famílias levavam para a igreja uma oferta que depositavam junto ao presépio: eram batatas, cebolas, réstias de alhos, abóboras, ovos, frutas ou mesmo galinhas, coelhos, chouriços, pés de porco. Havia também quem levasse surpresas; uma caixa fechada, que tanto podia conter, um casal de pombas como um rato. As melhores ofertas eram as de “comes e bebes” (num açafate ou tabuleiro, enfeitado com um paninho branco ou papel de seda recortado). Continham: um prato de bilharacos, uns figuinhos secos e tremoços, duas garrafas de vinho com os gargalos unidos por um fio com rebuçados ou bolachas penduradas, um prato de aletria, filhoses e uma garrafinha de branco, um pão de ló e uma garrafa de jeropiga, etc.

Terminada a missa, num leilão, rematavam-se as ofertas cujo produto se destinava ao culto. O Natal era, pois, uma festa voltada para o Menino Jesus e para Ele eram as prendas.

Só em alguma família mais rica ou mais evoluída a ementa melhorava, as pessoas comuns tinham a ceia igual à de todos os dias e só com sorte, umas filhoses, uns bilharacos, castanhas assadas ou figos secos e uma canaca de vinho quente com açúcar.

Nos largos ardiam grandes fogueiras, à volta das quais se reuniam apenas homens. Ali bebia-se vinho ou aguardente e comiam-se castanhas, laranjas e tangerinas que tal como a lenha eram roubadas nos “aidos” mais próximos. Os larápios insistiam com os donos para virem até à fogueira para mais facilmente lhes assaltarem os quintais.

Poucas eram as crianças que punham o sapatinho debaixo da chaminé por onde descia Jesus a trazer os presentes (pai natal não existia). Rebuçados, um par de meias, um brinquedo de lata, uma boneca de trapos eram o encanto de qualquer criança.

                           Aida Viegas (do livro - Oliveira do Bairro - Memórias de um Século)

Comentários

Mensagens populares deste blogue