No Século Vinte em Lisboa à Procura de Hotel 

 

         Joana chegara de Luanda há uma semana. Viera sozinha por estar grávida e o tempo em que lhe era permitido viajar estar a esgotar-se, devido à proximidade do parto. O marido por sua vez impossibilitado de viajar até àquela data, viria na semana seguinte, desconhecendo ainda o dia exacto.

Logo que lhe marcaram a viagem, enviou de Luanda um telegrama à esposa, a indicar-lhe o número do voo, e a hora prevista da sua chegada a Lisboa.

         Joana encontrava-se numa aldeia nos arredores de Aveiro em casa de seus pais, e por azar o telegrama chegou aos correios, depois do carteiro ter partido para a distribuição, facto pelo qual só foi entregue algum tempo depois. Ela fez contas à demora da viagem e concluiu que mesmo tomando o comboio rápido, chegaria a Lisboa depois de o avião já ter aterrado. Desanimada pensou que se o marido não a visse no aeroporto, seria pouco provável quedar-se por ali à espera. O mais lógico era sair à procura de hotel para passar a noite, visto que, comboio para Aveiro apenas teria no dia seguinte. Apesar de todas estas contingências, Joana uma jovem corajosa, resolveu empreender a viagem. Embora a ideia que teve fosse contra todas as previsões, algo lhe dizia que iria encontra-se com o marido ainda no aeroporto.

Em Luanda haviam combinado uma estadia cultural na capital, e Joana não queria arriscar-se a perdê-la por nada deste mundo. É certo que se não encontrasse o marido no aeroporto não teria modo de com ele comunicar, pois telemóveis nem sonhados eram na época. Havia um hotel onde normalmente costumavam ficar quando iam a Lisboa, e Joana pensou que Vítor deveria ir até lá, mesmo sem terem falado nisso. Era esta a fé que a movia, fiada de que o instinto os guiaria a ambos no mesmo sentido. (Coisas da juventude.)

         A verdade é que, Joana arrojada e optimista, tomou o comboio em Aveiro ao encontro do seu marido, ciente, sabe-se lá porquê, que lá se iriam encontrar.

         Chegada à estação de Santa Apolónia pediu ao taxista para a levar com a máxima brevidade ao aeroporto, e contou-lhe parte da sua aventura e expectativa. O homem voou através do trânsito, até porque uma senhora tão novinha, bonita, simpática e para mais grávida, merecia toda a atenção.

         Chegaram ao aeroporto passando muito da hora prevista, mas embora sem razão aparente, o certo, é que no placar das chegadas se encontrava a informação de que o avião do voo tal, aquele onde viajava Vítor, iria aterrar dentro de momentos.

         O milagre acontecera.

         Passado pouco surgiu Vítor, abraçando a esposa, muito preocupado com o atraso e a espera a que Joana tinha sido forçada, e explicava nervoso a causa da demora, uma fortíssima tempestade que obrigara o piloto a fazer um desvio na rota, de modo a chegarem inteiros ao destino. E tinham chegado bem, embora atrasados.

         Confirmara-se o ditado de que “há males que vêem por bem”. Joana apostara e ganhara.
 
          Aida Viegas (in Histórias de Bolso das Gentes de Aveiro)

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