( do livro DE MALA AVIADA - Com a aventura na alma e a poesia no coração)
 
 
 
S. Tomé e Principe 5

 

O navio lançou ferro ao largo. Não havia maneira de nos aproximarmos da costa.

Uns barquitos pequenos nos transportaram até ao cais, não mais que uma pequena plataforma, penso que, em madeira.

Não foi fácil encarar aquela travessia mas o que se nos deparou compensou o desconforto e o medo.

A ilha era um autêntico paraíso. Depois de visitarmos várias roças de café, cacau e palmares ficámos convictos de que seriam ali as nossas próximas férias, de licença graciosa.

Que maravilha! Como se vivia bem naquele rincão!

Quando porém trinta anos mais tarde nos convidaram para irmos a S. Tomé à inauguração do empreendimento turístico do Ilhéu das Rolas que curiosamente foi desenhado por meu filho, num gabinete de arquitectura, em Portugal, não imaginávamos o desgosto e o desanimo que nos esperava ao ver S. Tomé totalmente deitada ao abandono. Os palmares, os bananais, os cafezais, e as roças de cacau, tudo desprezado invadido por espécies infestantes, com os frutos pendurados nas árvores aos quais ninguém deitava mão. As belas, casas, das roças e as diferentes instalações anexas: escolas, hospitais, fábricas, casas para os trabalhadores, tudo estava desfeito, esventrado, sem telhados, portas ou janelas, tendo apenas as paredes, meio derrubadas, erguidas ao céu num clamor e o povo vivendo na mais confrangedora pobreza e miséria.

Chorei ao deparar-me com tal desaire.

Recebi, tive porém, ali uma das mais belas lições que me foi dado receber em toda a minha vida, uma lição de desprendimento que jamais esquecerei. Ao visitar a casa de uma missionária que, sendo brasileira, há vinte e cinco anos dedicava a sua vida a ajudar aquela gente, reparei no lugar onde vivia despojado de tudo, com apenas um catre onde dormia uma pequena arca, duas ou três cadeiras de madeira gastas e uma pequena mesa simples, simples, em cima da qual se encontrava uma larada de milho. Confrangida com tanta pobreza e simplicidade e com as palavras entaladas na garganta, disse em ar de graça: - Que rico milho, Irmã, para fazer pipocas! – Gosta de pipocas? Perguntou-me. – Se gosto! São uma delícia. – Quer que lhe dê uma mão cheia do meu milho e pede ao cozinheiro lá no Ilhéu para lhe fazer as pipocas?

Claro que agradeci, claro que me arrependi de ter falado e desejei mil vezes não o ter feito. Claro que fiquei engasgada, embatucada. A sua oferta tinha sido tão espontânea, tão sincera, tão generosa que jamais poderei esquecê-la. Claro que me senti a pessoa mais pequenina do mundo perante tanta grandeza.

O Ilhéu das Rolas, onde passámos uma semana, principescamente instalados, ali onde passa justamente a linha do equador, onde se encontra um marco deixado pelos primeiros portugueses que lá aportaram, em tempo de descobrimentos, assemelhava-se ao paraíso. Para além daquele espaço um outro mundo surgia de penúria e pobreza indescritíveis.

A minha África morreu ali.

 
                        Aida Viegas

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