As Andorinhas do Meu Telheiro Mal o tempo começa a aquecer, ei-las que aparecem. Vêm animadíssimas, todas satisfeitas, fazem-nos uma festa tal, que é um encanto ver! É a Primavera que chega trazendo de regresso as andorinhas a nossa casa. Nesses dias, dá-nos a sensação de que elas estão ali à espera de nós abrirmos o portão, e logo que isso acontece, começam a voltear por cima da nossa cabeça, esvoaçando baixinho, passando rentinho a nós, rodopiando num chilreio constante, uma e outra vez, como a saudarem-nos num cumprimento afectuoso e com uma alegria extraordinária. Durante aqueles primeiros dias elas não param de nos rodear, como a cumprimentarem-nos cheias de alegria, e eu tenho de confessar que esse espectáculo me encanta de tal maneira, que pode dizer-se que estou sempre ansioso pela sua chegada, tendo sempre a sensação que é recíproco o contentamento do reencontro a cada ano que passa. A felicidade que sentimos ao recebê-las, e sermos alvo de toda aquela demonstração de carinho por parte delas, é indescritível. Logo depois de toda esta festa, que decorre durante dois ou três dias, as nossas amigas, sem perda de tempo, dedicam-se à árdua tarefa da construção dos seus ninhos. É vê-las a trabalhar sem descanso na procura dos materiais mais adequados, para que seus filhos possam nascer e crescer com conforto e segurança. Transportam no bico, incessantemente, palhinhas, barro, e outros pequenos elementos que vão aglutinando dando-lhe a forma pretendida cujo interior será forrado de finas penas tornando-se num berço fofo e quentinho. É apenas no período de toda esta azáfama, que por aqui e por acolá, deixam por vezes cair algo do que transportam, e durante a estadia dos filhotes no ninho, que sujam um pouco o espaço, mas nada disso nos importa dada a alegria que nos transmitem. Após um período de acalmia, em que chocam os seus ovos, eis que, de repente, surgem débeis chilreios: ─ Temos passarinhos novos! Exclama o primeiro da família que der por eles. A partir de então, biquitos esfomeados apontam fora do aconchego do ninho sempre que um dos progenitores se aproxima com o bico carregado de viveres para alimentar todos aqueles seres um pouco desajeitados e feiosos, ainda implumes, mas que já muito se esforçam para receberem o seu quinhão. É sempre agradável olhá-las nas suas tarefas diárias ou nos seus passeios, mas o mais interessante é ver os jovens ensaiarem os primeiros voos; medrosos mas decididos atentos ao chamado e às instruções dos pais, eles lá vão tentando, até se sentirem capazes de voar sozinhos para mais tarde acompanharem todo o grupo na viagem de regresso, ao local de onde vieram, países mais quentes, onde irão passar os frios do nosso Inverno. Quando, criados os filhos, se começa a aproximar a hora da partida das andorinhas, noto de imediato a sua tristeza. São pios tristes e longos, olhares parados, voos rasteiros, ou muito, muito lá em cima, quase a perder de vista. Começam a juntar-se nos fios e a passarem longos momentos por ali paradas, tristes, a alegria da chegada há muito que desapareceu, nem parecem as mesmas. Isto repete-se dias e dias a fio, até que, uma certa manhã, tendo um grande número de aves reunidas, nos brindam então, com carinhos infindos, de novos voos rasantes e suaves, baixando sobre nós ternamente, quase roçando as nossas cabeças, devagar, devagarinho, uma e outra vez, como a beijarem-nos e a deixarem-nos, na saudade da despedida, um recado. Talvez a dizerem-nos que no ano seguinte voltarão de novo para o nosso beiral. E feita a despedida, tristemente e sem pressas, elevam-se juntas na imensidão do céu. Já lá bem em cima, recortadas no azul forte do Outono, dão ainda algumas voltas no ar, e de seguida, num bando enorme, formando uma mancha compacta, partem rumo a países longínquos à procura de calor. Deixam-nos tristes, muito tristes e com uma vontade imensa de as ver regressar bem depressa, com toda a alegria que as acompanha, por anunciarem a primavera, todo o carinho com que nos brindam, as nossas amigas, a quem tanto nos afeiçoamos, e tanto prazer nos dão. É uma lição de cordialidade e delicadeza, a que recebemos ano após ano, destes animaizinhos simpáticos e graciosos, que anunciam o bom tempo e o despertar da natureza, deixando em quem as aprecia, carinho e muita simpatia. Aida Viegas (in Histórias de Bolso das Gentes de Aveiro)
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RESPOSTA DA MINHA VISAVÓ Maria Almeida era uma jovem ao que ouvi um tanto irreverente, mas astuta. Falando um dia com uma familiar mais velha sobre o seu possível futuro casamento com um jovem da Silveira, Manuel da Silva Pires (de apelido Bartolo), a familiar disse-lhe: Então Maria! Ouvi dizer que te queres casar com o Manel Pires. Tu arrebitada como és pensas que vais para aquela casa de gente tão educada, estudada e rica e eles te aguentam o teu feitio? Queres mesmo casar-te com o rapaz e ires lá para o meio deles na Silveira? Vai, vai que eles lá tiram-te a lama das unhas. Ou te amochas ou vens recambiada, passado pouco tempo. Não se aflija tia Rosa que eu sei bem o que hei de fazer, passo ao Barbito, (um pinhal, cheio de mato, a meio do caminho entre uma casa e a outra) esfrego bem os pés no mato e deixo lá metade do meu génio e se ele me fizer falta, volto lá a buscá-lo. ...
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